Dia da Mulher: parabéns e muito obrigado a tudo que devemos a elas! __________ #DiadaMulher #Ciência #WagnerRMS @lenolivia @bianca.jadore ♥️♥️👏🏼👏🏼👏🏼 https://www.instagram.com/p/B9fLdruDQ6J/?igshid=1mmqb397lqrpm
Assista agora, no Amazon @primevideobr a série Nomade 7 do Diretor @flaviolangoni , da Produtora @livia_pinaud_audiovisual e do Roteirista Wagner RMS. . Neste Sci-fi BR premiado Internacionalmente, o protagonista Daniel morre de forma trágica, mas misteriosamente volta à vida na manhã seguinte com a oportunidade de dar um novo significado a sua vida, mas também assombrado por vozes que irrompem na sua cabeça. Estaria Daniel enlouquecendo? __________ #Nomade7 #ficçãocientífica #fraternidadeescritores #WagnerRMS https://www.instagram.com/p/CCrzQ4OjEnK/?igshid=1vapr7dm66gq
A jogadora quer viver de bola; o cozinheiro, criando pratos; o piloto, voando; a guitarrista, de show em show; o advogado, de causa em causa; e escritores, feito eu, sonham em te vender livros para — nem mais, nem menos — poder pagar as contas e escrever mais, dividindo sonhos e percepções, lágrimas e risadas, contigo.
Se sobrar um pouquinho para comprar livros, ir ao cinema e viajar, tanto melhor, sem dúvida.
Mas, muito mais do que viver do ofício de divertir e emocionar pessoas, sinto que escritoras e escritores têm algo ainda maior e mais importante por fazer. Devemos te fazer aspirar… pois enquanto te embalamos num romance, ou chacoalhamos numa aventura, e te fazemos sonhar com outras vidas possíveis, outros mundos, outras histórias para além das que você conhece, te fazemos almejar por mudanças, por novidades, por coisas extraordinárias que você poderá, de algum modo só seu, tornar reais. É o sonhar que leva à aspiração, que leva à fé, que leva à ação, que leva, enfim, à realização.
Nós, que escrevemos, que contamos histórias, somos a força ignitora deste processo. Temos que ser a chama mais inicial da torrente de labaredas de um foguete chamado “você”, que te conduz rumo ao amanhã, para alcançar todo o teu potencial. E desconfio que essa tarefa de dar início aos sonhos cabe, em especial e com grande responsabilidade, àqueles que escrevem sobre o futuro e o fantástico.
Veja, se um menino norte-americano se tornou engenheiro e criou os celulares que revolucionaram nossas vidas em todo o mundo, por ser convidado a sonhar e a realizar tal feito assistindo ao capitão Kirk usar seu comunicador sem fio, em suas jornadas nas estrelas, então há poder e responsabilidade nisso!
Imagine o nosso Povo brasileiro, tão capaz de se virar e de dar seu jeito, mesmo quando tudo está contra ele, sendo mergulhado em obras nacionais que o coloquem em situações extraordinárias e desafiadoras, muito além daquilo com que nossa gente está habituada. Imagine livros, séries e filmes nacionais que falem sobre os desafios que ainda estão por vir, ou que excedam a nossa realidade, e sobre brasileiros fazendo coisas incríveis para enfrentar essas adversidades, protagonizando grandes histórias, indo a lugares incríveis, mudando o destino da humanidade. Agora visualize nossos jovens crescendo dentro desta cultura, onde não só os estrangeiros protagonizam a ficção científica e a fantasia.
Percebe?
Quantas menininhas engenheiras nós deixamos de inspirar? Quantos moleques nutricionistas nós permitimos que nunca sonhem em liquidar com a fome no mundo? Nós somos capazes de criar inventos espetaculares, explorar mundos distantes e até universos paralelos! Podemos ser autores de feitos memoráveis! Mas precisamos ser alertados e lembrados disso, até que esteja no nosso DNA.
Mas nós ainda olhamos muito mais para trás, do que para frente no tempo. O passado é inquestionavelmente importante. Sem conhecer nossa história, não podemos evitar cometer erros por vezes seguidas, e, portanto, não podemos avançar. Mas, mesmo com autoras e autores novos se esforçando para mudar isso, nossa sociedade ainda é conduzida, em seu sonhar, por uma esmagadora quantidade de livros, filmes e novelas que nos legam passados e atualidades, geralmente dolorosos e crus, como se nossa mente coletiva e cultural afirmasse, repetidamente, que isso é o que somos, e é tudo que podemos ser. Não!
Sairíamos das cavernas, se só mirássemos o presente e o passado, e jamais pudéssemos sonhar com um futuro sem fome e doenças? O que seria da aviação sem um contador de histórias que nos legasse a fábula de advertência e desafio que é Ícaro? Sem o sonho, não há prosperidade, pois o primeiro é a semente mais essencial da segunda. Portanto precisamos nos imaginar e nos ver lá no futuro, ali no extraordinário, e mais além como protagonistas da superação e da inovação. E podemos fazer isso, capacidade não nos falta, basta crer e apostar. Eu aposto escrevendo e consumindo histórias de brasileiros protagonizando o futuro e o fantástico.
Aposte. Todos ganham.
As Mulheres que me dão o privilégio de fazer parte de suas histórias incríveis corroboram com esta Verdade!
Protagonistas, leitoras e autoras. Temos muito orgulho delas!
Mônica: http://bit.ly/monicadeveraux
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Apareceu primeiro no: Instagram da editora: https://mementofutura.com
O prêmio de Melhor Diretor de Ficção Científica, do Asia Web Wards, é um reconhecimento incrível e muito merecido, Mestre Flávio Langoni! Parabéns! Torço para que o mundo reconheça cada vez mais o teu trabalho tão talentoso, e a paixão criativa e o profissionalismo dos Criativos Brasileiros.Você é, sem dúvida, um dos nossos Grandes Representantes. 😃🇧🇷👏🏼👏🏼👏🏼 ... @asiawebawards Best Science Fiction Director award is an incredible and well-deserved recognition, Master Flávio Langoni! Congratulations! I hope the world increasingly recognizes your so talented work, and the creative passion and professionalism of the Brazilian Creatives. You are undoubtedly one of our Great Representatives. 😃🇧🇷👏🏼👏🏼👏🏼 __________ #outrolado #otherside #awa2019 #bestdirector #novafriburgoparaomundo #webserie #scifi #scifibrasil #FlavioLangoni https://www.instagram.com/p/B6XbjiGj79f/?igshid=e02utiidfdbt
Meus profundos agradecimentos àqueles que me deram a honra de me ler até aqui! Vamos em frente, neste texto um tanto crítico, outro tanto irônico, onde Milton, uma pessoa tão comum e tão desalentada pela realidade crua quanto muitos de nós, mergulha em um mundo de paranóia, ciência, e conspirações, tentando encontrar a si mesmo dentro de um prisão que ele crê eterna!
Leia a Parte 1 de "Sob o Olhar da Eternidade"
Qual a Probabilidade?
Milton comprou, à prestação, um fotômetro. O mais preciso que o Google conseguiu lhe indicar. Ajustou o aparelho, e começou, dia após dia… Ou melhor, nas repetições daquele dia, ele começou a tentar pegar o raio de luz que lhe cegava. Mas o Universo, como da hábito, não pretendia entregar seus segredos sem lutar, e as mesmas coincidências que o levavam a ser cegado pelo reflexo na cúpula de vidro agora o tiravam, diligentemente, do alvo.
— Você mora perto da minha casa, não? — Disse-lhe sua vizinha, subindo ao seu lado a escada rolante para a plataforma do trem, em Madureira, quando ele ia para o trabalho.
Era inacreditável, mas o fato de ele saber que o dia se repetia deveria estar causando flutuações mais intensas na realidade, pois lá estava, bem ao lado dele, a mulher que tanto o atraia, e que jamais havia percebido a existência de Milton, e agora não só estava a menos de um metro dele, mas também tomou a iniciativa de puxar assunto. Antes mesmo que ele pudesse responder, ela riu, sem jeito, e foi dizendo:
— Desculpe, não me entenda mal. Quero dizer… — Riu de novo, ainda mais sem graça. — Mas somos vizinhos, não somos?
— Você é muito lind… — Engolindo de volta o que tentou dizer em um ato falho, Milton engasgou ligeira mas visivelmente, tentando também consertar o dito: — Minha vizinha, sim, você é minha vizinha.
— Eu sabia! — Ela sorria. — Meu ônibus enguiçou, tive que pegar o trem. Não costumo fazer isso, mas como eu sei que você é um cara gentil, eu, meio louca, sei lá, perguntei antes de perceber que isso iria ficar estranho.
Milton comprou, à prestação, um fotômetro. O mais preciso que o Google conseguiu lhe indicar. Ajustou o aparelho, e começou, dia após dia… Ou melhor, nas repetições daquele dia, ele começou a tentar pegar o raio de luz que lhe cegava. Mas o Universo, como da hábito, não pretendia entregar seus segredos sem lutar, e as mesmas coincidências que o levavam a ser cegado pelo reflexo na cúpula de vidro agora o tiravam, diligentemente, do alvo.
— Você mora perto da minha casa, não? — Disse-lhe sua vizinha, subindo ao seu lado a escada rolante para a plataforma do trem, em Madureira, quando ele ia para o trabalho.
Era inacreditável, mas o fato de ele saber que o dia se repetia deveria estar causando flutuações mais intensas na realidade, pois lá estava, bem ao lado dele, a mulher que tanto o atraia, e que jamais havia percebido a existência de Milton, e agora não só estava a menos de um metro dele, mas também tomou a iniciativa de puxar assunto. Antes mesmo que ele pudesse responder, ela riu, sem jeito, e foi dizendo:
— Desculpe, não me entenda mal. Quero dizer… — Riu de novo, ainda mais sem graça. — Mas somos vizinhos, não somos?
— Você é muito lind… — Engolindo de volta o que tentou dizer em um ato falho, Milton engasgou ligeira mas visivelmente, tentando também consertar o dito: — Minha vizinha, sim, você é minha vizinha.
— Eu sabia! — Ela sorria. — Meu ônibus enguiçou, tive que pegar o trem. Não costumo fazer isso, mas como eu sei que você é um cara gentil, eu, meio louca, sei lá, perguntei antes de perceber que isso iria ficar estranho.
— Não ficou. Não, não ficou. Somos vizinhos, devemos nos conhecer. — A pasta tiracolo dele escorregou de seu ombro, e Milton a ajeitou. — Tudo anda tão louco, que é bom saber que pessoas conhecidas estão por perto… Ei, desculpe perguntar, mas como sabe que eu sou gentil?
— As pessoas falam. — Ela estava estonteante, arrumada para o trabalho, elegantemente e sutilmente sensual. Devia ser advogada, ou algo assim, ele pensava.
— Pessoas?
E dali em diante ficava fácil deduzir o por que fez ele não ter conseguido medir o reflexo luminoso, de novo. Na verdade ele nem lembrou do flash até chegar ao Centro do Rio. Sua vizinha, que se chamava Rheny Alencar Roussel, explicou a ele sobre como as senhoras da vizinhança, que gostavam dela pois todos os sábados Rheny jogava cartas com elas, haviam colocado Milton na lista de boas e más pessoas das redondezas, enquanto fofocavam inofensivamente entre si. Ele era uma das pessoas boas. Uma certa senhora do grupo, que Steinberg sempre achou que não gostava muito dele, o viu respondendo aos acenos de crianças dentro um ônibus que agitavam as mãozinhas nas janelas (quando acenam para você, é educado, ele achava, acenar de volta, especialmente quando se percebe a alegria inocente dos pequenos) em uma rua próxima, deixando-as risonhas e felizes.
Milton jamais imaginaria que ele pudesse estar em uma lista dessas, no lado das boas pessoas, e se sentiu feliz com aquilo. Tão feliz que, ao se despedir de Roussel, sem, no entanto, reunir coragem para pedir a ela um telefone ou algo assim, subitamente se deu conta de que havia esquecido de medir o reflexo luminoso!
Na tentativa seguinte, exatamente quando Milton levantava o fotômetro, um sujeito lhe disse que estava perdido, que precisava ir ao Centro mas que não sabia se estava indo na direção certa, pois era de fora do Rio, e estava ali para buscar uma irmã, que ele não via há quase vinte anos, e etc e tal, e pronto, lá se foi sua chance naquela manhã de medir o foco luminoso.
No dia posterior Steinberg estava tentando, dentro do vagão em movimento, acionar o aparelho de medição sem tirá-lo da bolsa, pois nos dias anteriores achou que os seguranças da linha férrea o estavam olhando torto, talvez estranhando que ele andasse apontando aquele aparelho para lá e para cá, enquanto o calibrava. Milton, portanto, passou a tirar o fotômetro só quando estava chegando perto do ponto onde a luz o atingia. Mas enquanto tentava acionar o aparelho que, por alguma razão misteriosa não queria ligar, ele foi abordado pelo pedinte ranzinza, que o cutucou com uma caneca, e disse:
— Qualquer dez centavos serve.
— Hein? Ah, sim. Eu não tenho.
— Você nunca tem.
Milton ficou olhando para o pedinte, um senhor de certa idade, sem saber o que dizer além de um xingamento, que, em verdade, ele preferia não dizer. Steinberg não era muito velho, mas era do tempo em que não se xingava tão levianamente quanto hoje em dia. Então, subitamente, o homem preso em um único dia se viu perguntando ao mais velho:
— Para quê o senhor quer dinheiro?
— Estudar.
— C-como? O que você disse?
— Isso que você ouviu, rapaz. Na verdade eu sempre explico, mas você é um daqueles muitos que não escutam, que não querem escutar, ou estendem a mão e deixam cair seus trocados aqui na caneca, — a peça de plástico se agitou e tilintou na mão dele — ou fingem que não me viram. Uns poucos me dizem um mais cortês não. Você sempre me diz não, mas pelo menos fala comigo.
— Me… Desculpe.
O velho deu de ombros e prosseguiu, animado em conversar:
— Lembra do cara que morava na rua e que estudou e passou para o concurso do Banco do Brasil?
— Ouvi falar…
— Pois é. Eu já fui professor, agora moro na rua, junto com outras pessoas em um buraco na estação de Madureira. Mas acho que posso sair dessa, seguindo o exemplo daquele homem, estudando.
— Professor? — Milton ficou com a impressão que conhecia o velho pedinte, e essa impressão deve ter transparecido em seu rosto, pois o outro foi dizendo:
— Sim, eu fui seu professor no ginásio. Eu nunca esqueço um rosto, eu acho que você era o… Rosemberg?
— Steinberg. Português? O senhor ensinava português?
— Estudos sociais.
— Como? Quero dizer, como isso aconteceu, professor?
— A profissão já não tem muito prestígio no país no futuro, sabe como é. O país das desgastadas chuteiras tem tudo para ser o país dos diplomas, mas não é. — Seu sorriso não desapareceu, mas seus olhos expressavam mágoa, quando completou: — E, cá entre nós, convenhamos, droga só pode chegar tão fácil na mão da gente com a conivência, ou coisa pior, dos governantes, certo?
Milton, agora, foi quem deu de ombros. Aquilo era uma coisa que todo mundo sabia, política e marginalidade no Brasil eram quase sempre a mesma coisa. Steinberg fez uma cara triste. Achava que lembrava, vagamente, do professor, e ele era um cara que ensinava legal, sempre risonho, parecia gostar muito de lecionar.
Steinberg se atrasou para o trabalho naquele dia. Ele e seu antigo mestre comeram juntos na mesma cafeteria que Milton sempre frequentava, e o professor viu a xícara de café vibrar e o líquido preto dentro dela se preencher de ondas concêntricas!
— O senhor viu isso? Viu só?
Ele tentou explicar ao idoso professor que aquilo acontecia diariamente, e não teve certeza se o cara entendeu que algo inusitado estava acontecendo. Depois disso Milton passou em uma livraria com seu antigo mestre, que sonhava em voltar a estudar, e quase estourou o que restava do limite do seu cartão de crédito, comprando apostilas e livros para o sujeito, cujo rosto se iluminou, ele tinha uma chance! Em uma LAN house, Steinberg fez um perfil no Facebook para o sem teto, anotou os dados em um dos livros que haviam comprado, e fez o cara prometer que, quando superasse aquela época difícil, após passar no concurso, iria fazer contato com ele. Milton sabia que isso não aconteceria, pois nunca mais haveria amanhã, mas, caramba, justamente por isso, dane-se! Deu algum dinheiro para o sujeito, e se despediu dele. O velho professor ficou tão feliz que Milton só lembrou do flash luminoso no dia seguinte.
Mais um dia e Steinberg estava, de novo, no vagão, e conseguiu, com algum esforço, chegar à exata posição onde, ele já estava cansado de saber, o raio de luz o atingia. Mas assim que chegou lá, tossiu. Um sujeito de terno e gravata, com aparência de executivo, parecia ter passado a noite anterior dentro de um grande tonel cheio de perfume! Se ao invés de cheiro o camarada estivesse exalando fogo, o trem inteiro teria explodido e estaria ardendo em chamas! Era quase insuportável, mas, desta vez, Milton estava decidido a não deixar nada, de jeito nenhum, impedir que ele fizesse a medição da luz. Fincou pé em sua posição e armou o fotômetro assim que o trem parou na estação logo antes de onde ele sabia que o raio luminoso costumava aparecer. Em cerca de dois minutos o flash espocaria da cúpula de vidro do templo religioso, mas não atingiria seus olhos, e sim o sensor do fotômetro.
Houve um certo tumulto, na estação em que o trem havia parado, um burburinho, algumas pessoas correndo, e Steinberg ouviu, em algum lugar, a palavra “assalto”, mas não houve uma explosão de gente em fuga, o que pareceu indicar que tudo havia passado. As portas da composição se fecharam, ele apertou o sensor luminoso na mão direita, enquanto a esquerda segurava firmemente a barra de metal acima dele, que servia para que as pessoas entulhadas ali dentro se mantivessem de pé, para caberem mais dos ditos dignos trabalhadores por metro cúbico.
Steinberg olhou furtivamente em volta de si, e não viu nenhuma pessoa conhecida, ergueu o aparelho, pondo ele em frente ao rosto e… Seu telefone tocou. Ele ignorou. Alguém dentro do vagão gritou alguma coisa. Ele ignorou.
A qualquer instante a luz iria espocar!
Mas antes disso, alguém esbarrou nele, se levantando de um dos assentos à frente, abarrotados de pessoas, como quem quer fugir, sair de perto dele, e Milton percebeu, de canto de olho e depois olhando diretamente, que dois seguranças, com bonés e coletes de cores berrantes, vinham em sua direção, olhando-o com raiva!
— Larga esse troço! — Um deles gritou, enquanto o outro levantava um cassetete.
Milton, que sabia o quão bem treinados eram esses tipos de profissionais no seu país, desatou a correr, claro. Ou melhor, tentou correr no engavetamento de gente que era o vagão balouçante de trem naquele momento da manhã.
Um agressivo estalo elétrico o fez perceber que alguém, certamente um dos seguranças, empunhara uma arma de choque, e instintivamente Steinberg começou a empurrar as pessoas, como o afogado que empurra a água tentando respirar! Em algum lugar seu celular tocava sem parar, ele nem se dava conta, enquanto lutava para escapar. Ele chegou ao fim do vagão e atravessou o acesso que havia entre as composições acotovelando quem estivesse pela frente. Milton chegou a levar um soco desengonçado de alguém, mas estava com a adrenalina tão alta, que mal sentiu o fraco golpe, enquanto ouvia os gritos cada vez mais selvagens dos dois seguranças, que praguejavam e xingavam Steinberg, as pessoas que atrapalhavam a perseguição, maldizendo tudo, até o mundo que era uma merda! Corriam aos tropeções, os três, enquanto as pessoas faziam o possível para sair do caminho, quando Milton bateu contra a parede no fim daquela composição, não havia acesso à próxima composição, não havia mais para onde ir. A não ser para fora! Então, empurrando as pessoas que, apavoradas, se contorciam para escapar, ele se esgueirou até a lateral onde estava a saída, agora fechada, segurou a borracha carcomida entre as duas abas da porta do vagão, enfiando ali os dedos e agarrando essas abas com os cotovelos apontados para os lados, e fez força para abrí-las. Forçou uma, duas vezes. Os seguranças cada vez mais próximos. Novamente Steinberg forçou as portas, que cederam, relutantemente no começo, mas se escancarando devido a má conservação no final! A ventania entrava, visto o trem estar em plena velocidade, e Milton parou no limiar da porta aberta, olhando o chão de brita correr abaixo. Virou o rosto, viu que o trem se aproximava de mais uma estação, logo iria desacelerar, se ao menos conseguisse atrasar os seguranças, pensou. E imediatamente se deu conta dos camelôs que pululavam entre os passageiros, sempre tentando vender seus produtos no meio daquele sufoco, pagando propina sempre para os seguranças da linha férrea, mas não raro perdendo tudo que tinham para os caras, quando estes resolviam fingir trabalho para seus superiores. Milton gritou:
— Meganha! Segura os meganhas! — Usando gíria que, em suas infindáveis viagens de trem, ouviu os camelôs usando.
Alguém, para sorte de Steinberg, perdeu o senso de perigo e resolveu agir, pondo uma perna bem no caminho do segurança que já estava quase alcançando Milton, e o cara desabou no chão, seguido do colega. A arma de choque deve ter disparado, pois ouviram-se gritos e estalos elétricos. No tumulto que se seguiu, o trem já estava quase parando na estação, e Steinberg desceu correndo, o fotômetro ainda na mão, esquecido. Girando no próprio eixo, ele percebeu que estava na estação ao lado da Quinta da Boa Vista! Poderia correr para o metrô, e desaparecer por lá. Subiu as escadarias correndo, e talvez tenha sido esse o seu erro ingênuo, pois assim que os seguranças que o perseguiram dentro do trem começaram a berrar (deveria haver um rádio quebrado em algum lugar, um monte deles para os seguranças, os quais a corrupção endêmica brasileira não deixava serem consertados nunca) outros seguranças vieram correndo de cima, e se atiraram sobre Milton, o único cara que parecia fugir, pois estava em disparada. Steinberg foi derrubado, rolando escada abaixo e batendo a cabeça.
Escuridão.
Pobre Homem Louco
Milton despertou numa espécia de enfermaria sem janelas. A porta estava aberta, ele pôde ver assim que se levantou da maca em que havia estado. E assim que ele fez isso, por esta porta entraram os dois seguranças que o haviam perseguido, seguidos de ninguém menos que Rubens, que foi dizendo:
— Foi bom ele acordar, significa que ninguém aqui vai se encrencar.
— Ele é que tá encrencado, chefia. — Disse um dos seguranças, cujo crachá Milton se esforçava mas ainda não conseguia ler.
— Ah, colega, quê isso?
E o Doutor Castilho se aproximou do segurança, despretencioso mas sério, e continuou, em um quase sussurro:
— Olha para o meu amigo. Ele está tendo uma crise, um atque de ansiedade. — e falando em um tom ainda mais baixo: — O pobre homem está louco, passando por muita coisa, não feriu ninguém além dele mesmo. Vamos esquecer isso tudo.
Milton, cuja cabeça latejava, conseguiu ouvir o murmúrio, e fez cara de quem não gostou, mas um instante depois sua expressão mudou. Estaria mesmo louco? Seria tudo aquilo imaginação dele? A certeza que tinha dentro de si, de que o mesmo dia se repetira eternamente, era pétrea, mas sua vida estava começando a ficar tão louca com aquilo, que a certeza de que ele próprio era uma pessoa sã já não era tão forte. Lembrou da Navalha de Occam, de Alice, e se calou, apenas observando enquanto Rubens conversava com os outros homens. O segurança com quem Lewroy iniciou a conversa, em certo momento, fez que sim com a cabeça, e disse:
— Está bem, doutor. Todo mundo tem seu dia de cão. É tanta sacanagem, violência e roubo que tá todo mundo com os nervos estourando.
— É mesmo. Tudo anda tão desanimador. — Concordou Rubens.
— É isso mesmo. A gente parece que tem acesso a mais informação, tipo pela Internet, mas fica sabendo que político tudo é bandido, que copa do mundo é tudo armação, que a vida podia ser bem melhor, mas se depender de quem manda, nunca será, que acaba ficando meio louco.
O outro segurança, mais calado, apenas balançou a cabeça, concordando. O primeiro segurança, mais falante, ficou um momento em silêncio, olhando para Milton, que ainda massageava a própria nuca, e então o sujeito disse:
— A gente também anda cansado. Confundimos ele com ladrão… Faz o seguinte, espera aqui que eu vou avisar a chefia e logo depois liberamos vocês, tá bem?
Lewroy abriu os braços e meneou a cabeça, dizendo simplesmente:
— Obrigado, caras.
Ambos os seguranças se foram.
Milton, constrangido, inseguro quanto a sua própria sanidade, já ia agradecer à Rubens, e perguntar como ele o encontrou, quando Lewroy o agarrou pelos ombros, o fitou olho no olho, a menos de um palmo de distância do seu rosto, e disse, num sussurro, quase selvagem:
— Milton! Escuta, cara! Alice, ela sabe de alguma coisa sobre um projeto que eu e ela participamos, e que eu não sei. Tem haver com o que você apareceu lá no meu trabalho.
— Q-que projeto?
— Uma iniciativa internacional, um experimento prático, que foi levado a cabo há alguns dias. Não interessa, só me escuta: fica longe, muito longe da Urca e da Alice, está bem? Acho que é perigoso, cara, eu tô dando um tempo, vou sair do Rio.
— Como você me achou?
— O Clinton é um amigo meu, Federal. Seu celular. Agora levanta, vem, nem vamos esperar os seguranças, não podem nos manter em cárcere, é ilegal. Vamos, eu te ajudo. Ah, toma isso, estava contigo e eles me devolveram, eu expliquei que é inofensivo, apenas um fotômetro.
Se pondo de pé, e pegando o aparelho das mãos do amigo, Steinberg fez um sinal de que podia andar sozinho, quando o outro tentou apoiá-lo. Apanhou também sua pasta tiracolo, que estava nos pés da maca, a pôs no ombro, e seguiu Rubens, que saiu na frente, mas assim que o físico pôs um pé fora da claustrofóbica enfermaria, este levou a descarga de uma arma de choque, Milton viu o clarão e ouviu o som inconfundível!
Enquanto seu amigo físico desabava no chão, os olhos de Steinberg se arregalavam! Estava encurralado!
Continua na próxima semana, não perca...
Leia a Parte 3 de "Sob o Olhar da Eternidade"
Comente, participe! Milton está louco?
O poder que as histórias contadas por um povo tem sobre seu próprio futuro!
Neste caso, assistir Dana Scully em Arquivo-X, uma mulher independente, de ciências, forte, inspirou muitas mulheres a seguir carreiras científicas! Espetacular isso! Espetacular!
Sei e sinto esse poder que a ficção especulativa tem há décadas, por isso acho que temos que tem mais que comédias e obras sobre as mazelas brasileiras, precisamos urgentemente ter fortes e grandes personagens, místicos, futuristas, atuais, mas sempre inspiradores, que façam por nossa gente o que Miss Scully fez por mulheres no mundo todo.
Em tempo, obviamente Scully é fonte de inspiração também para Mônica Alencar Deveraux (http://bit.ly/livro-Monica) também, mesmo que eu tenha apimentado mais a profissional federal brasileira, com toques de magia e sensualidade, mas Dana, com sua força, sensibilidade e intelectualidade, contribuíram, certamente.
Sugiro também o excelente texto sobre este mesmo tema: http://www.momentumsaga.com/2015/11/o-efeito-scully.html
Enfim, para estar no futuro, você precisa se imaginar nele, nunca esqueça disso.
O Efeito Scully
“Ora (direis) ouvir estrelas! Certo Perdeste o senso!” E eu vos direi, no entanto, Que, para ouvi-las, muita vez desperto E abro as janelas, pálido de espanto… E conversamos toda a noite, enquanto A Via Láctea, como um pálio aberto, Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto, Inda as procuro pelo céu deserto. Direis agora: “Tresloucado amigo! Que conversas com elas? Que sentido Tem o que dizem, quando estão contigo?” E eu vos direi: “Amai para entendê-las! Pois só quem ama pode ter ouvido Capaz de ouvir e entender estrelas” (Olavo Bilac)
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#Repost @fraternidadedeescritores . 《A Terra Estranha》 . Para que a humanidade abandone sua infância, nestes tempos em que o obscurantismo ameaça nosso futuro, é preciso menos muros e mais pontes que conectem pessoas com pensamentos e vidas distintas em um único sentimento de união. Munido de empatia, você sente o lado da outra pessoa e constrói dali para si o caminho de paz e convivência produtiva. Vejamos: . Nascido em 07/06/1907, em uma família que se gabava de ter participado de todas as guerras dos EUA, desde a independência. Lutou para entrar para a marinha, graduando-se engenheiro. Lotado no porta-aviões USS Lexington, foi um dos 1ºs especialistas em radiocomunicações. Após dois enlaces frustrados, casou-se com Virginia Gerstenfeld, com quem viveu até o fim da vida. Contraiu tuberculose e foi reformado pela marinha. Após muitas tentativas de recolocação profissional, começou a escrever para pagar sua hipoteca. . Foi o 1º autor de ficção científica a sair do gueto das revistas Pulp, abrindo caminho para o gênero ser levado mais a sério. Acreditava que não se pode escrever FC sem base na ciência assim como é impossível escrever um romance histórico sem conhecimentos de história. Criou o termo Ficção Especulativa e o fascinante conceito O Mundo Como Mito, onde a ficção é real. Estende sua influência literária até hoje. Até Mechas nipônicos têm raízes nos trajes blindados das Tropas Estelares do autor. Ele foi uma dos Três Grandes da FC em inglês, ao lado de Clarke e Asimov. . Rejeitava explicitamente o racismo. Criava personagens femininas competentemente técnicas, embora muitas vezes estereotipadas. . Foi acusado de apologia ao militarismo e à guerra, até de fascista ao descrever futuros onde a sociedade funcionaria (bem) sob regimes essencialmente militares. Defendia a liberdade sexual e a eliminação do ciúme sexual, o individualismo e o nudismo. Apoiava testes nucleares norte-americanos, ao passo que era descrito como exemplo de generosidade. . E aí, quantas pontes existem entre você e Robert A. Heinlein? . Algumas obras: Um Estranho em uma Terra Estranha, Tropas Estelares Por Wagner RMS . #fraternidadeescritores #RobertAHeilein #sci-fi #WagnerRMS https://www.instagram.com/p/CLL66ZzjWbc/?igshid=o48ooaxf3vs4
Você confere agora, no vídeo acima, a entrevista com o Escritor e Roteirista Wagner RMS, autor da série Código 7 Infinidade, no programa de TV Fluxograma!
Direção: Flavio Langoni
Produção: Lívia Pinaud
Apresentação: Marília Tapajóz
Leia também a resenha que publiquei sobre "Se Eu Ficar" no site sobre filmes Infinidade!
"O filme — e o livro — questionam aquele que vê, e que lê, sobre o que é realmente importante na vida. E falam sobre o quão angustiantes são as escolhas que essa mesma vida nos trás, de repente. Como você pode perder, subitamente, tudo aquilo que mais ama, e ainda assim encontrar forças e seguir adiante? Ou será mais certo, apesar de tabus e falsos moralismos contra tal atitude, desistir e partir? Tudo isso do ponto de vista de Mia Hall (Chloë Grace Moretz), uma jovem violoncelista, uma moça como todas as outras moças, única! "
Conheça também:
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Leia agora dois capítulos deste livro:
Novamente, novamente e novamente. Todo dia era — quase, havia os quanta — tudo sempre igual. Quando a moça loira (antes havia sido morena, ou um rapaz, ou ainda uma senhora adorável cor de avelã, mas a entrega era sempre a mesma) lhe entregou, escorregando por sobre o balcão, a xícara de porcelana cheia de fumegante e cheiroso café, puro, preto, Milton Steinberg se arrepiou todo, como se fosse a peça de porcelana uma víbora! Então ele olhou em torno, só percebendo naquele instante que estava na cafeteria, a mesma de ontem, de antes de ontem, de todos os dias! Olhou de novo para a xícara, pois logo a superfície do café vibraria, captando, com suas ondulações, a explosão distante, e tudo recomeçaria, de novo e de novo. — O de sempre, senhor Milton. — Falou a atendente, com seu sorriso claro e sardento, como se o conhecesse há anos, como se fosse ela mesma que lhe entregasse aquela mesma xícara (seria a mesma? Átomo a átomo?) toda manhã. Sua mão trêmula pegou a xícara por cima, como quem pega um pote de alguma coisa perigosa. Foi neste instante que a jovem atendente viu a pistola na outra mão de Steinberg e foi recuando, dizendo: — Ai meu Deus, ai meu Deus... O homem armado arregalou os olhos, fitou a arma em sua outra mão, como se a visse pela primeira vez, embora soubesse claramente como ela tinha ido parar lá. Depois, com um movimento brusco da cabeça, relanceou em volta novamente, esticando a cara para fora da cafeteria, e foi então que ele viu homens uniformizados! Policiais, carcereiros! Encostados em uma viatura, não muito distantes dali, conversando soturnamente. Milton olhou de volta para a atendente, que, acuada, continuava rogando a Deus e a ele por misericórdia. Com um olhar de súplica, Milton apontou a pistola para a jovem, que se encolheu, mas se calou, chorando baixinho. Talvez, pensava o homem, suando e tremendo, mesmo que atirasse nela, ela, no dia seguinte, voltaria, ou talvez a versão idosa dela. Steinberg sentia um nó na garganta, o peito oprimido, talvez tivesse que atirar, o sistema estava ali, em torno dele, novamente, novamente e novamente, cada parte agora eternamente corrupta do sistema impelindo seu dedo no gatilho, talvez para atirar em si mesmo, antes que fosse arrastado e trancado por toda a eternidade em uma cela (onde quer que ficasse, naquele dia eterno, jazeria para sempre). Sem saber o que fazer, ele baixou um pouco o punho armado, percebendo que aquilo era inútil, terrivelmente consciente de que o dia, novamente, novamente e novamente, o levou até aquela xícara, ele chorou, agoniado. Na xícara, o café ondulou, rápida mas delicadamente, no mesmo instante em que Milton percebeu que seus carcereiros vinham correndo em sua direção, e em que ele levantou novamente a arma, pronta para atirar. Outros funcionários da cafeteria começaram a se esconder e a gritar. A jovem do outro lado do balcão exibia as mãos espalmadas à frente de si mesma, que ela agitava no ar, como se estivesse negando algo, pois sua boca, silenciosamente, repetia sem parar “não, não, não”…
A vida cotidiana é o veneno que se encarrega de envelhecer e enfim matar as pessoas. Ao menos Milton Steinberg pensava assim, quando, pela terceira vez naquela semana, despertou de mau humor, comeu alguma coisa, se banhou e vestiu, pegou a pasta tiracolo, pendurou no ombro, e saiu para trabalhar, as seis, como de costume. Brasileiro invulgar, não tinha a faculdade comum aos seus compatriotas de rirem no caos, e certamente devia ser julgado extremamente mal por isso, cercado de gente que ria enquanto era tratada como escrava por seus servidores públicos, administradores e pela comunidade economicamente dominante, de um modo geral. Não que Milton não sorrisse. Sorria quando via um azul perfeito no céu, ou algum raro ato de bravura ou bondade na rua. Mas em geral apenas enxergava pessoas fingindo que o que elas estavam fazendo tinha alguma relevância. Não tinha. Filósofo de quinta categoria, Milton sabia que sob o ponto de vista da eternidade, nada era perene, tudo se dissolveria no tempo e no espaço, ninguém seria lembrado por absolutamente nada do que fez, as pessoas mais famosas da mídia ou da história um dia, mesmo que levasse cem mil anos, seriam completamente esquecidas, e nada do que foi feito teria valor em si, a não ser como uma infindável corrente de repetição, nascer, viver, morrer para outros nascerem, viverem e morrerem depois. Certamente essa linha de raciocínio foi uma das precondições causadoras do que estava por vir. Ela o assaltava vez em quando, especialmente quando seguia para o trabalho na lata de conserva superlotada que as pessoas chamavam de trem, indo de Madureira para o Centro do Rio de Janeiro, e ainda mais especialmente quando seus olhos captavam algo estranhamente fugidio, um dos diversos pequenos eventos repetitivos que preenchem as vidas das pessoas, como por exemplo, um lampejo de luz na cúpula de vidro de um templo religioso qualquer, que teimava em fulgir justo nos seus olhos, quando passava por ali de trem. Naquele dia o evento se repetiu justamente quanto Steinberg matutava sobre sua filosofia barata e desanimadora (ao menos ele pensava assim), sobre o fato incontestável de que um amontoado de gente era enlatada diariamente em um ir e vir de horas, somente para que seus filhos e netos fizessem a mesma coisa, eternamente e indignamente. Quando o raio de luz o cegou, Milton piscou e imediatamente resmungou e praguejou entre os dentes. Sempre que aquele reflexo, que não dava a mínima para existência do sujeito, lhe cegava, ele pensava que no dia seguinte estaria em outro vagão, e que não se esqueceria de pegar sua condução voltado para o lado contrário de onde vinha o reflexo. E algumas vezes cumpria mesmo o intento, mas em algum momento esquecia, ou fatos como pessoas empesteadas de perfumes, ou com rádios altos, ou mesmo um pedinte que teimava em lhe pedir o dinheiro que não tinha e o encarar de forma rancorosa quando recebia um “não”, todos esses pequenos eventos, comuns, o conduziam, como o dançarino conduz a dançarina, reposicionando-o e girando-o, um pouquinho aqui, outro tanto ali, e zap! O reflexo o pegava de novo, bem nos olhos, o relâmpago cegante! Não acontecendo todos os dias, claro, mas acontecendo muitas vezes ao ano. Como era possível? Haveria algum destino? Não, não conseguia conceber um mundo-prisão onde você só existe nele para compor um quadro já pintado, sem chance de ser outra coisa além daquilo, tão pouco, que era. A bem da verdade Steinberg talvez tivesse mais medo daquela possibilidade do que argumentos razoáveis contra a veracidade dela. Zap! Imprecações, verborragia murmurada, tinha sido pego novamente, novamente e novamente por aquele flash de luz refletida na cúpula de vidro do templo. E por causa do pedinte, de novo, que por sua vez só entrou no mesmo vagão que ele por conta de ele ter ajudado outra pessoa perdida a achar seu caminho ao parar para dar uma informação e perder seu ônibus das seis e quinze que o levaria até a estação de trem, e, provavelmente ele só teve que parar para dar informação por ter feito um caminho mais longo para se desviar daquela mulher que morava na rua ao lado e que se achava a garota mais bonita do mundo e para o ego da qual ele não queria dar alimento a custa dela perceber que ele a achava mesmo muito bonita, enfim… E foi aqui que o cerne da ideia surgiu… Essas coisas se repetiam, não todos os dias, ele sabia, lia sobre essas coisas, sabia da incerteza quântica e etc, que alguns diziam nada ter haver com o mundo macroscópico em que vivemos, e se restringir ao nível atômico, mas ele duvidava muito disso, as incertezas é que mantinham os dias ligeiramente diferentes uns dos outros, pensava ele. Qualquer dia iria perguntar sobre esta sua teoria ao seu amigo físico, Rubens Castilho Lewroy, o velho Binho Cranião, Lewroy Cabeção, gênio do colégio e que trabalhava agora na Urca, naquele laboratório do governo. Iria sim, perguntar a ele. Um dia. Desceu do trem, na Central do Brasil, aquele monumento ao fato de que se trabalho dignificasse, aquele lugar naturalmente transpiraria dignidade, e não ruína política e social. Milton evitou uns menores provavelmente embebidos em crack e mal intencionados, driblou um camelô vociferante vendendo guarda-chuvas abertamente e celulares roubados mais discretamente, esquivou-se de motoristas que achavam que, nos sinais de trânsito, os pedestres é que deveriam dar passagem aos carros, e, enfim, descobriu que o ônibus que costumava pegar para o último trecho da viagem já havia partido antes do horário, então ele voltou à Central e, soterrando-se em outro transporte público, caiu no metrô que o esmagou novamente e o regurgitou na estação Carioca, de onde Milton emergiu como quem vê pela primeira vez, depois de décadas de trevas, os raios do Sol. Desanimado, pediu um café na cafeteria da esquina. Dona Glória (estava escrito no crachá dela), a atendente, com sua pele castanha e seu sorriso branco, lhe entregou o café preto e fumegante. O homem sorriu gentilmente para a graciosa senhora, em agradecimento, ajeitou a pasta tiracolo no ombro para poder pegar a xícara, olhou para a xícara, e parou de sorrir. Sobre a superfície de ébano líquido do café, ondas concêntricas se formaram, mas não no centro da xícara, e sim espalhando-se, da área voltada para Steinberg em direção ao lado oposto, ligeiramente mais distante do peito do homem. Nada demais, a vibração de um ônibus ou dos trens subterrâneos, se não fosse o fato de que duas outras coisas desconcertantes aconteceram neste mesmo instante: primeiro Milton sentiu sua carne vibrar a partir de suas costas até seu peito, como se o que empurrou a superfície do café tivesse passado por dentro dele próprio; e segundo, Steinberg teve a clara certeza de que tudo aquilo que estava vivendo já havia acontecido antes. Não a sensação vaga de um déjà vu, mas a certeza factual de que tudo estava se repetindo, não a mera e massacrante rotina cotidiana, mas de fato, de verdade, ele estava preso, horrivelmente preso, em um mesmo dia que, com algumas variações, era eternamente o mesmo. Não sabia como sabia daquilo, apenas sabia, como sabia seu próprio nome ou o que era uma xícara. À volta de Steinberg as pessoas pareciam vagamente incomodadas. Sim, muitas pareciam desconcertadas, ele achava, mas rapidamente voltaram aos seus afazeres. Elas haviam tido um déjà vu, mas Milton havia sido o único, por alguma razão incompreensível para ele, que sabia o fato de aquele ser o único dia que existiria para sempre. Olhou para trás de si. Ponderou. Sacou o celular para avisar que não iria trabalhar, e logo depois era engolido pelo metrô novamente. Era hora de conversar com o Rubens.
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